“a palavra no papel, a linha no pano, a lã na tela”
Feito à Mão, Lygia Bojunga
Retrato de uma artesã
Rachel Facó
A autora Lygia Bojunga possui uma obra do seu tamanho: modesta e literariamente rica. São atualmente 22 livros publicados para crianças, jovens e adultos. A autora foi a primeira, fora do eixo Europa-Estados Unidos, em 1982, a ganhar pelo conjunto da obra – na época, com seis livros publicados – o prêmio Hans Christian Andersen - IBBY e, em 2004, foi consagrada com o prêmio ALMA – Astrid Lindgren Memorial Award, a maior premiação concedida até hoje à literatura para crianças e jovens. Detentora também de diversos prêmios nacionais, como o Prêmio Jabuti (1973, “Os colegas” e 1983, “Seis vezes Lucas”) e mais de uma dezena de prêmios conferidos pela Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil – FNLIJ, a autora é referência literária reconhecida.
Em 1999, três anos após a publicação da 1ª edição do “Feito à Mão”, onde o seu eu-artesão deu vida a um livro – da arte de lavrar as palavras, a confecção dos papéis, passando pela encadernação e à entrega, em mãos, dos seus 120 exemplares em uma apresentação teatral – Lygia reluta, mas lança uma edição nos moldes tradicionais: a publicação em escala industrial e distribuição comercial do livro feito à mão. Com ele nasce a “obra” dentro da obra: uma carta de 45 páginas, em um livro de 140, dirigida aos seus leitores – inicialmente, uma maneira de compartilhar e dar vida à textura e às tessituras da edição original do “Feito à Mão”. Com sua linguagem coloquial – marca de todos os seus textos – a autora estabelece uma ponte, uma conexão além do livro, com seus leitores. A verossimilhança de sua narrativa ganha um novo espaço de expressão, a carta nomeada pela autora: o “Pra você que me lê”.
Movida pelo desejo de estreitar a sua relação com o livro, Lygia Bojunga inaugura uma Casa Editorial, em 2002, para todos os seus personagens. Com o livro “Retratos de Carolina”, a editora recebe o seu primeiro “morador” e a autora amplia sua relação com o leitor: mistura-se à personagem e passa a “revelar” o seu processo criativo. O “Pra você que me lê”, que nasceu no livro “Feito à Mão” (Ed. Agir), ganha corpo com a editora e firma-se como um espaço autêntico, de conversa com o leitor. É a autora-artesã abrindo não somente uma editora, mas um canal de interação com o seu leitor à moda antiga. Sem bits e bytes. Feito à mão, papel e tinta.
foto: arquivo pessoal, casa Lygia Bojunga