Fundação Cultural Casa Lygia Bojunga

Fundação Cultural Casa Lygia Bojunga
Un Novo Nicho pra Santa

sábado, 20 de abril de 2013

Sabrinas e Palomas


Sabrinas e Palomas
                         Juliana Borel

Apareceu assim, como se eu estivesse em alfa o tempo todo e, de repente, ele surgiu na minha frente. Engraçado é que há pouco tempo eu tinha ouvido falar daquele livro. Por isso, quando por acaso vi Sapato de Salto, da Lygia Bojunga, numa livraria do Centro do Rio, não pude parar de pensar que, se destino existe mesmo, aquilo devia ser um sinal.
Então, comprei o livro. Tive que esperar algumas semanas para mergulhar de cabeça, pois ainda terminava de ler Saco de Ossos, do incrível Stephen King (já leu? Não recomendo para quem tem problemas cardíacos... É só um alerta!). E assim, em alguns dias, saí do imaginário mundo bizarro de King para o real mundo de Lygia.
Sapato de Salto... Se eu não soubesse que o livro aborda temas como abuso sexual e prostituição infantil, talvez achasse que a história fosse uma comédia romântica daquelas bem açucaradas, com momentos de transformação da protagonista de patinho feio para a menina mais bonita da escola.
A história de Sabrina não poderia ser mais distante disso! Uma garotinha órfã que já aos 10 anos descobre toda a crueldade que pode haver nos homens. Abusada a primeira vez na casa onde vai trabalhar como babá e os infortúnios que a levam a se prostituir vão, aos poucos, indo dos olhos para o cérebro, percorrendo nossas entranhas, invadindo nossas veias do entendimento e atacando nossos corações. Pelo menos foi isso o que senti... Um verdadeiro soco no estômago.
Curioso mesmo é como a Lygia consegue abordar com leveza um assunto tão pesado. Como o soco desferido pela história de Sabrina consegue, ao mesmo tempo, ferir e entreter.
Conheço pessoas que choraram o livro inteiro. Eu não.
Não, o que me fez chorar no livro foi a bondade de Paloma, a mãe de Andréa Doria (que delícia o Andréa Doria), mulher submissa de Rodolfo (pena, muita pena, do Rodolfo), irmã do Leo (o mundo precisa de mais Leos como o dela) e cheia, cheia de amor. O que me fez chorar foi a sua esperança e a sua certeza de que sempre é possível salvar uma criança, não importa quanto mal ela tenha visto ou vivido.
Sim, foi isso o que me fez chorar. Perceber que temos mais, muito mais, Sabrinas do que Palomas no mundo.
E, se o acaso decidir, e um dia uma Sabrina aparecer na minha vida, espero, do fundo do coração, ser uma Paloma para ela.

* Juliana Borel é jornalista, participa do curso de literatura infantil da Estação das Letras